terça-feira, 2 de novembro de 2010

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Cheguei a pensar que estava insegura, mas descobri que é alguma dor, incômodo mais fácil de resolver, no sentido de que a insegurança é sobre dois. E dois é exatamente o que temos, dois relógios desregulados, dois tempos desencontrados. E no meio me encontro justamente quando estou com você, em você. E tem o que ainda fica, as sobras, o que vem junto, o que o corpo não esquece, continua a crescer, o que não tem pausa de relógio regulado ou desregulado, o que talvez não se explique mesmo. E no meio do caminho sobrou o tubo de pasta de dente amassado, lençol, roupa e prato sujo, colcha amassada, ventilador ligado, chuveiro quebrado e não sei o que foi feito deles. Não sei deles porque fazem sentido só com você, isso tudo, esse nós espalhado. E você já foi. É só isso, questão de querer. Querer não ter que ir embora. Questão de querer não saber do momento de ir embora. De querer não ter que ir dormir sabendo que de dia vou ter ido embora. De querer não ter que ver o dia sabendo que de noite vou ter que. Só de não saber talvez já fosse um alívio nisso tudo que agora permanece. Acho, na verdade, que é esse saber, essa constatação que mata. Porque é o que se seguiu, é aí que nos vemos, desse saber da partida. Não quero mais saber. Não quero saber de nada. Saber que não vou ter que acordar e te ver ir embora não é a melhor opção, a melhor é a espera. Mas por enquanto só vislumbro ela, a espera. A espera pressupõe surpresa e te viver em um espaço de tempo que me permita todas as surpresas que você me trás diariamente. Que bom. Quero um dia, dois, três, quatro, ver todos os sorrisos de um dia, as caras feias, as possíveis lágrimas, as palavras, todas, sem medo, os sons, o silêncio. Poder presentificar mais tudo que se segue em mim sem pausa, tudo em mim que é por você, nos dias com o sem. Então talvez nem exista mais dias sem você, são só dias. E é de fato o com você que mais me interessa, de todas as formas. Nas formas que os nossos corpos pedem. Acho mesmo que quanto mais a gente tem mais a gente espera. Vamos abrir espaço no meio do caminho, agir pra criar um tempo só nosso e fazer ele chegar. Cansar as paredes. É mais simples, não se trata de nada que não tem nome e que se perdeu. Tem nome e está achado, encontrado e precisa ser vivido. Agora estou bebendo mais um vinho sozinha. Que bom, só que dessa vez a sobra foi pra dois. Foi mesmo. É. E apesar de tudo tenho certeza do que não morre, nem em saber qualquer, nem em espera. Vive e segue. O contrário seria impossível. Sem você as paredes não aquentariam.

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